A Bienal de Mercosul decorre até 29 de Novembro na cidade de Belo Horizonte e esta é uma das suas melhores edições. Distribuídas as obras dos mais dos trezentos artistas convidados pelos dois museus principais da cidade e pelos armazéns junto ao rio, a Bienal é vocacionada para a apresentação das obras de artistas sul-americanos, mas não só. O tema da edição deste ano é "Grito e Escuta".
No Museu de Arte Moderna pode ver-se a excelente exposição “Desenho das Ideias”, montagem dividida em dois andares e apresentando uma diversidade de estilos, de propósitos do desenho e de suportes. Impressiona o desenho na parede de Iran Espírito Santo, a parede com os desenhos de Delcy Morelos e de Anna Maria Maiolino, os desenhos sobre o êxodo chinês provocado pela construção da barragem das três gargantas de Yun-Fei Ji (um dos artistas presente na exposição Atlas de Acontecimentos durante o fórum cultural Estado do Mundo), as obras sonoras activistas e poéticas de Arnaldo Antunes, Augusto de Campos, Fabio Kacero e Décio Pignatari.
Yun-Fei Ji, The Owl
Nos armazéns as obras estão organizadas a partir de vários temas como o Absurdo, Árvore Magnética, Biografias Colectivas, Ficções do Invisível, etc.. De todas as secções merece-me destacar “Ficções do Invisível” cuja curadora é Victoria Noorthoorn. A secção apresenta-se como “uma exposição que reúne artistas que colocam em cena sua própria relação com o processo artístico e, ao se exporem, expõem cruamente aqueles aspectos da produção artística que habitualmente ficam apagados ou sublimados na obra terminada: o questionamento interno, a estrutura dos processos, a economia de meios, o rompimento da função, a relação entre obra e vida privada, as vicissitudes a que o artista deve se submeter enquanto sujeito social atravessado por determinações de idade, gênero, raça, religião, tradições, linguagens...
Muitas vezes isto compreende um despojamento da linguagem artística e um desvelamento de suas estratégias retóricas. O artista desenvolve uma linguagem não mais pura, se não simplesmente mais direta e mais pobre (citando o escritor irlandês Samuel Becktett, ‘Me pus a escrever em francês com o desejo de me empobrecer ainda mais. Esse foi o verdadeiro motivo’) renunciando ao capital técnico e simbólico que a tradição acumulou em seu aparente benefício. Empenha-se em desaprender o aprendido, em regressar a essa obscuridade que foi seu ponto de partida e meio inicial. Os artistas incluídos nesta exposição dão conta deste processo partindo de um extremo ascetismo, da confrontação direta e da exposição brutal da condição social do artista. Se a arte é uma representação, estes artistas colocam em cena o que está por trás da cena. Se a arte é uma máquina, arrancam a couraça e nos mostram as suas engrenagens. Se é um corpo, expõem os músculos e os órgãos.”
Do conjunto das obras, todas elas absolutamente pertinentes e onde o corpo, o som e a palavra têm uma presença rara e excelente, são particularmente perturbantes pela sua grandeza: "Breath", uma peça de Samuel Beckett com 40 segundos de duração, aqui encenada por Daniela Thomas, “O Samba do crioulo doido” que trata da resistência do corpo da autoria de Luiz de Abreu ou o registo em vídeo da peça de Jerôme Bell sobre a bailarina em palco Véronique Doisneau, uma actualização cénica da vida do artista como trabalhador.
A Bienal do Mercosul é uma prova de que o Próximo Futuro passa por ali.
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário