sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Bujumbura


Contaram-me que, em Bujumbura, durante um dos vários conflitos, em que a cidade está deserta mas há olhares à espreita, viam-se os hipopótamos a sair do lago e a passear pelas ruas da cidade…

Bujumbura é uma cidade entre lago e montanha, situada na região dos Grandes Lagos, na ponta norte do Tanganica. Para ela vão convergindo as verdes colinas do Burundi.

O centro da cidade preenche-se diariamente com gentes vindas dessas “colinas” (zonas rurais). Mas a cidade mantém um movimento fluído, com congestionamentos apenas a certas horas do dia e nas proximidades do alarido do mercado. Táxis azuis e brancos, carros, camiões, e motos preenchem o tráfego por entre as constantes bicicletas, que, de tudo, transportam um pouco. É uma cidade funcional e ordenada, de fácil orientação, diferente da confusão de muitas capitais africanas. Com um centro pequeno, composto por casas e prédios baixos, ao estilo da colonização belga, cada serviço, loja ou barraca improvisada tem a sua função e os seus clientes. Não faltam também os cibercafés que ao longo do dia se vão enchendo de jovens. Aqui servem-se refeições para além de se poder tomar o saboroso café do Burundi.

Apesar do calor húmido, a curiosidade obriga a caminhar. Percorre-se discretamente as ruas, de dia e de noite, com uma sensação de segurança que se consegue em poucas cidades. A pobreza vai-se misturando com os passeios e é a cada ano mais saliente, pela quantidade de gente descalça ou de aspecto desnutrido.

A cidade é um convívio discreto de vários mundos, com um estar disciplinado que a mantém activa na azáfama dos dias.


Hutus e Tutsis vivem agora mais uma fase de reconciliação. Um dia-a-dia de luta com as tensões do passado e ainda algum medo de repressões. Mas isso não se percebe à primeira. Não se fala, pela discrição e receio de que o passado possa contagiar o futuro. A história foi conflituosa e dela não pode haver orgulho.

E Bujumbura é ficar a olhar para as pessoas e tentar perceber de que falam os rostos que sentiram o genocídio, sem identificar um Hutu ou um Tutsi.

Mas o quotidiano flui, a beleza do lugar e a simpatia das gentes distrai-nos.


No fim-de-semana à beira do lago ou junto às praias com areia, as famílias vão-se refrescar e conviver. Facilmente assistem a um ensaio ou espectáculo dos famosos drums (batuques) do Burundi, a beber uma Amstel e a petiscar ndagalas (pequenos peixes fritos do lago).

Mas Bujumbura também é, ficar à beira do Tanganica a fazer parte da variação dos tons de luz, entre o lago e as montanhas do Congo à sua frente. E assistir em silêncio à saudação dos hipopótamos, que ao fim de tarde continuam a aparecer, agora sem se aproximarem da cidade.

Sandra Ferreira
Consultora cooperação e desenvolvimento

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